Notícia

Pesquisa investiga vulnerabilidade de idosos no consumo de alimentos

Pesquisa relaciona situação a problemas em rótulos e embalagens, tamanho dos produtos e ambiente dos supermercados

Freepik

Fonte

UnB | Universidade de Brasília

Data

quarta-feira, 27 dezembro 2023 06:05

Áreas

Nutrição Coletividades. Saúde Pública

Imagine que você está num supermercado. Você sai em busca de um produto e se depara com corredores mal sinalizados, o que dificulta a sua empreitada. Ao pedir orientação a um funcionário, você é ignorado e decide seguir a procura por conta própria. Nos espaços estreitos entre prateleiras, você esbarra em outros clientes e acaba se acidentando, até finalmente encontrar o alimento que deseja. Não demora para outra surpresa: ao ler o rótulo para ter certeza de que os ingredientes são adequados à sua dieta, depara-se com letras miúdas que mal permitem sua compreensão.

Essa situação pode ocorrer com qualquer pessoa na compra de alimentos no supermercado, mas torna-se mais impactante para pessoas idosas. São entraves que  Thaíssa Castelo Branco pesquisadora em Administração da UnB avaliou como uma forma de vulnerabilidade… Ela acrescentou que a vulnerabilidade também se configura como a incapacidade de atingir objetivos de consumo.

Durante o mestrado, defendido no Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA/ADM/Face), a pesquisadora analisou o sentimento de impotência de idosos no Brasil na experiência de consumo de alimentos. Com o estudo, vinculado ao Laboratório de Estudos em Consumo Sustentável – Conscient da UnB, Thaíssa Branco ganhou o prêmio Edgar Reis de dissertações e teses, do PPGA, em sua primeira edição. Os resultados foram publicados recentemente na revista científica Journal of Macromarketing, revista científica internacional de alto impacto na área de marketing – e seletiva em suas publicações.

Thaíssa decidiu pesquisar o assunto por indicação de sua orientadora Dra. Solange Alfinito, professora do Departamento de Administração  que percebeu a incipiência dos estudos sobre vulnerabilidade do consumidor, sobretudo, idoso e a relação com a compra de alimentos.

“O consumidor, de maneira geral, em várias situações e contextos, está cada vez mais vulnerável, porque as empresas estão sendo mais agressivas nos seus apelos, sem se preocupar com as consequências disso. A consequência do lucrar se sobrepõe à consequência do que é o bem-estar do consumidor”, apontou a docente, também coordenadora do laboratório Conscient.

Idosos ativos  – Para a pesquisa, realizada durante a pandemia de covid-19, Thaíssa entrevistou 17 pessoas com mais de 60 anos de seis estados brasileiros e do Distrito Federal. Ela chegou a esses participantes a partir de indicações de amigos e de suas redes de contatos.

Em uma primeira etapa da pesquisa, foi necessário aplicar questionário para avaliar a reserva cognitiva dos voluntários, o que permitiu compreender se estas pessoas eram ativas e autônomas na realização das compras de produtos alimentícios.

“Quanto mais ativa a pessoa é durante a sua vida, mais reserva cognitiva tem e melhor consegue lidar com os déficits ao longo do tempo. Por isso que tem algumas pessoas que você já percebe alguma dificuldade maior no processamento [das ideias] e outras não”, detalhou Thaíssa.

A Dra. Solange Alfinito explicou que o questionário permitiu filtrar os participantes que poderiam se voluntariar para a fase de entrevista, de forma que fosse possível cumprir o objetivo de pesquisa de análise da experiência de consumo do próprio idoso. Além disso, a ideia era considerar o recorte de idosos que estavam realizando compras presenciais mesmo no contexto da pandemia.

“A gente não podia pegar uma pessoa cujo cuidador faz tudo e ela não é ativa nesse processo de compra, porque a gente queria ver exatamente o que impacta a pessoa, se não, não seria [avaliada] a experiência da pessoa”, argumentou a docente.

A ideia inicial era realizar a abordagem presencialmente, mas por conta da eclosão da pandemia, foi necessário adaptar o método, em resguardo aos entrevistados, considerados grupo de risco. A opção foi por realizar entrevistas por telefone, para facilitar o contato com o público-alvo.

Perceber como as condições que levam à vulnerabilidade no consumo podem ser associadas especificamente às pessoas idosas foi foco de Thaíssa no diálogo com os entrevistados. Isto, segundo a pesquisadora, implica observar tanto as chamadas condições internas, o que inclui características biofísicas – como mobilidade, equilíbrio e força motora –, psicossociais e estado individual da pessoa naquele momento do consumo, quanto as condições externas, ou seja, fatores que não estão ao alcance do consumidor.

“As condições externas são justamente o que a gente não tem controle, como, por exemplo, a discriminação, o estigma com o idoso. A gente tem também os elementos físicos e logísticos do mercado, ou seja, quando o estabelecimento não está adaptado para receber uma pessoa com deficiência, por exemplo”, explicou Thaíssa.

Frustração – Nas conversas, a pesquisadora percebeu série de situações de vulnerabilidade relatadas pelos idosos, o que sinaliza que as empresas alimentícias muitas vezes não consideram as necessidades desta população. “Percebemos letras pequenas [nas embalagens], que é uma dificuldade que pode ser considerada comum e até esperada, mas o que não era esperada era a falta de contraste nas embalagens, que é muito difícil para a lente ocular do idoso”, citou a pesquisadora.

“Reclamavam do fundo azul com letras vermelhas nas embalagens, que não dá um contraste legal para ler a informação. E mais, eles acabavam desconfiando da indústria alimentícia: ‘esse alimento não é saudável para mim. Se fosse saudável, eles iam querer que eu lesse’.”

Outro sentimento observado foi o de frustração na hora de abrir determinadas embalagens por conta do declínio na força das mãos. “Muitos deles tinham essa dificuldade muito grande e começavam a adotar estratégias para remediar a vulnerabilidade. Então eles pegavam facas, outros mecanismos para tentar abrir aquele produto. Isso poderia gerar um dano físico, um acidente doméstico, um corte na mão”, exemplificou Thaíssa.

Acesse o resumo do artigo científico (em inglês).

Acesse a notícia completa na página da UnB.

Fonte: Serena Veloso, Secom UnB. Imagem: Freepik.

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