Notícia

Mutação genética de origem africana predispõe mulheres à obesidade

Grupo da UFMG investigou variante em 6,4 mil indivíduos, inclusive homens, e observou que estes não têm seu IMC afetado pelo fenômeno

Pixabay, arte

Fonte

UFMG | Universidade Federal de Minas Gerais

Data

terça-feira, 2 março 2021 15:45

Áreas

Nutrição Clínica. Saúde Pública

Segundo dados da última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) realizada pelo IBGE em 2019, houve aumento da prevalência do sobrepeso e da obesidade em adultos brasileiros. De acordo com os dados coletados, 96 milhões de pessoas, o equivalente a 60,3% da população adulta no Brasil, apresenta índice de massa corporal (IMC) maior que 25, o que equivale ao chamado sobrepeso. A obesidade, representada por IMC maior que 30, está presente em 22,8% dos homens e 30,2% das mulheres que vivem no país. Tais dados são preocupantes, uma vez que a condição pode estar relacionada à maior predisposição a doenças cardiovasculares e a outros problemas de saúde.

Para entender melhor como a obesidade se manifesta nos brasileiros, um grupo de pesquisadores da UFMG acaba de publicar o artigo “Admixture/fine-mapping in Brazilians reveals a West African associated potential regulatory variant (rs114066381) with a strong female-specific effect on body mass- and fat mass-indexes”, na revista científica Journal of Obesity. No trabalho, o grupo liderado pelo professor Dr. Eduardo Tarazona Santos, do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), decidiu investigar os genomas dos brasileiros miscigenados que têm predisposição à obesidade. “Como o genoma brasileiro é um mosaico de fragmentos de origens africanas, indígenas e europeias, decidimos explorar os genomas para entender se ele possuía algumas partes que poderiam estar associadas à obesidade”, conta o pesquisador.

As amostras analisadas foram coletadas em 6.487 indivíduos dos municípios de Salvador, na Bahia, Bambuí, em Minas Gerais, e Pelotas, no Rio Grande do Sul, por meio do Projeto Epidemiologia Genômica de Coortes Brasileiras, o Epigen-Brasil, maior iniciativa em genômica populacional e epidemiologia genética da América Latina. Com a análise das amostras, o grupo da UFMG encontrou uma variante genética de origem africana que contribui para um aumento considerável do IMC. Chamada de rs114066381, a variante foi observada em homens e mulheres adultos miscigenados. Ficou constatado que ela só apresenta efeito no índice de massa corporal das mulheres.

“Essa mutação é uma das que mais influencia o índice de massa corporal entre as mais de 200 mutações atualmente conhecidas. Como a maior parte das variantes genéticas que favorecem a obesidade foram descobertas em indivíduos de origem europeia, que já são os mais estudados pelos cientistas, é muito importante a descoberta de uma variante africana presente em nossa população”, disse o Dr. Tarazona.

Segundo o professor, o estudo trouxe algumas descobertas inesperadas. A primeira refere-se ao fato de que a variante genética mais presente em fragmentos dos indivíduos de origem africana foi encontrada inicialmente no Sul do Brasil, região que apresenta mulheres miscigenadas, mas predominantemente europeias. “A população do sul do Brasil estudada tem uma contribuição europeia de aproximadamente 70%, mas, mesmo assim, o gene africano aparece por lá, ou seja, os brancos brasileiros de origem europeia têm esses pedaços do genoma africano. Isso mostra que mesmo esses indivíduos podem fornecer informações importantes sobre a genética de doenças nas populações africanas ou naquelas miscigenadas com populações africanas”, argumenta o Dr. Tarazona.

O segundo fator de destaque da pesquisa, segundo o pesquisador, refere-se ao fato de que a variante genética descoberta atua somente em mulheres adultas miscigenadas. “Isso pode ter relação com a evolução biológica das mulheres, uma vez que já são conhecidas outras variantes genéticas que fazem as mulheres acumular mais gordura que os homens. Apesar de sabermos que a obesidade está relacionada à alimentação e aos hábitos das pessoas, já são conhecidas mais de 200 variantes genéticas que influenciam na predisposição genética para obesidade. Por isso, o fator genético precisa ser levado na formulação de políticas públicas que visam combater a obesidade.”

Caçadores de genes

Os geneticistas que se dedicam à identificação de genes que podem ser associados às doenças costumam ser chamados de gene-hunters (ou caçadores de genes). A descoberta da variante africana da obesidade foi feita por meio do mapeamento por miscigenação. “Inicialmente, descobrimos a origem africana, europeia ou indígena de cada fragmento do genoma de cada pessoa. Depois, observamos que algumas regiões do genoma, como uma do cromossomo 13, tendia a ser africana nas mulheres mais obesas. Na última etapa dos estudos, investigamos as variantes genéticas que estavam nesses pedacinhos africanos”, explica a pesquisadora Dra.Marília Scliar.

No artigo, o grupo mostra que a variante rs114066381 tem frequência em aproximadamente 1% na população geral, mas entre as mulheres com obesidade mórbida (o maior nível de obesidade) do Sul e Sudeste do Brasil ela chega a 10%. Segundo a Dra. Scliar, a descoberta ressalta a importância de estudos sobre populações não europeias. “Grande parte dos estudos genômicos mundiais ocorre em populações europeias, o que restringe muito as pesquisas. É importante termos descoberto uma variante de origem africana com grande efeito sobre a obesidade em populações não muito estudadas.”

Além disso, a pesquisadora ressalta que a sequência de passos da pesquisa desenvolvida pelo grupo favorecerá o estudo de outras doenças associadas aos genomas. “O passo a passo que criamos pode ser usado em pesquisas que se debruçam na investigação de como diversas variantes genéticas predispõem os indivíduos a uma gama grande de doenças”, conclui a Dra. Scliar.

Acesse o resumo do artigo científico (em inglês).

Acesse a notícia completa na página da UFMG.

Fonte: Luana Macieira, UFMG. Imagem: Pixabay, arte.

Em suas publicações, o Canal Nutrição da Rede T4H tem o único objetivo de divulgação científica, tecnológica ou de informações comerciais para disseminar conhecimento. Nenhuma publicação do Canal Nutrição tem o objetivo de aconselhamento, diagnóstico, tratamento médico ou de substituição de qualquer profissional da área da saúde. Consulte sempre um profissional de saúde qualificado para a devida orientação, medicação ou tratamento, que seja compatível com suas necessidades específicas.

Os comentários constituem um espaço importante para a livre manifestação dos usuários, desde que  cadastrados no Canal Nutrição e que respeitem os Termos e Condições de Uso. Portanto, cada comentário é de responsabilidade exclusiva do usuário que o assina, não representando a opinião do Canal Nutrição, que pode retirar, sem prévio aviso, comentários postados que não estejam de acordo com estas regras.

Leia também

2024 nutrição t4h | Notícias, Conteúdos e Rede Profissional nas áreas de Alimentos, Alimentação, Saúde e Tecnologias

Entre em Contato

Enviando
ou

Fazer login com suas credenciais

ou    

Esqueceu sua senha?

ou

Create Account