Notícia
Pesquisa desvenda características de bactérias presentes em queijos artesanais brasileiros
Estudo permite o aproveitamento de recursos da biodiversidade brasileira para manter características regionais, assegurar a manutenção do patrimônio cultural, social e econômico associado à produção
Antoninho Perri, Antonio Scarpinetti - Unicamp
Fonte
Jornal da Unicamp
Data
quarta-feira, 23 dezembro 2020 09:10
Áreas
Biotecnologia. Ciência e Tecnologia de Alimentos. Engenharia de Alimentos
Os queijos artesanais brasileiros se caracterizam principalmente por serem feitos em sua maioria com leite cru e processos de produção que refletem a história, a cultura e o estilo de vida de comunidades tradicionais de diferentes regiões do país. O emprego de leite não pasteurizado e que, portanto, não recebeu tratamento térmico, garante a manutenção da microbiota endógena ou selvagem destes queijos, constituída principalmente por bactérias láticas e leveduras, que consiste em um conjunto de microrganismos naturais ao próprio sistema, considerados benéficos à saúde do consumidor. Eles são responsáveis pelas reações bioquímicas que ocorrem durante a maturação, conferindo aos produtos variedades de aromas, sabores, textura e cores que caracterizam os queijos artesanais.
Embora a produção desses queijos utilize de técnicas mais rústicas, a legislação específica considera queijo artesanal o elaborado por métodos tradicionais, com vinculação e valorização territorial, regional ou cultural, conforme protocolo estabelecido para cada tipo e variedade, e produzido com o emprego de boas práticas agropecuárias e de fabricação.
Entretanto, a produção desses queijos esbarra em alguns problemas. O emprego do leite cru tem colocado em questão a segurança desses produtos artesanais, pois a exigência da legislação de um período de maturação de no mínimo 60 dias, descaracteriza o processo e a qualidade sensorial dos queijos artesanais brasileiros, que historicamente possuem período de maturação de aproximadamente 20 dias.
Em decorrência da utilização do leite cru os queijos artesanais possuem grande diversidade de bactérias láticas – aquelas normalmente utilizadas na produção de iogurtes e outros produtos alimentícios fermentados e derivados do leite. A diversidade das bactérias láticas depende inclusive de vários fatores como tipo de rebanho, clima, ambiente, processo de fabricação em que há, por exemplo, variação na quantidade de sal utilizado e na sequência de etapas adotadas na produção.
Supondo inicialmente o rico potencial da microbiota endógena dos queijos artesanais para aplicação biotecnológica, como produção de enzimas proteolíticas, lipolíticas e glicolíticas – que quebram respectivamente moléculas de proteínas, de gorduras e de carboidratos (lactose), essenciais para o processo de maturação dos queijos e a resistência às condições de processamento, a engenheira de alimentos Dra. Larissa Pereira Margalho desenvolveu tese de doutorado que teve como objetivo estudar as propriedades tecnológicas e probioóticas de suas bactérias láticas selvagens.
Foco do estudo
Considerando o apelo cada vez maior dos consumidores por produtos mais saudáveis, naturais e seguros, o estudo focou-se no isolamento e na determinação das propriedades tecnológicas e probióticas de 1002 bactérias lácticas presentes em 578 amostras de queijos artesanais brasileiros provenientes das regiões Norte – queijo do Marajó; Nordeste – queijo coalho e manteiga; Sul – queijos colonial e serrano; Sudeste – queijos minas artesanal das microrregiões Araxá, Canastra, Campo das Vertentes, Serro e Cerrado; e Centroeste – queijo caipira.
Com o intuito de selecionar desse conjunto as melhores cepas para aplicação em culturas lácteas a autora realizou um triagem de alta performance (teste de todas as 1002 cepas) na colaboração estabelecida com a empresa holandesa Nizo Food Reseach, onde fez parte de seu doutorado com financiamento da Fapesp. Esta seleção racional possibilitou agrupar estas bactérias em três grupos principais: aquelas com potenciais biopreservadores – que atuam inibindo patógenos e têm função conservante; as com características probióticas – com propriedades potencialmente benéficas à saúde dos consumidores; e as com potencial para atuarem como culturas adjuntas – que atuam na etapa de maturação, gerando sabores mais intensos devido à alta capacidade de produzir enzimas proteolíticas e lipolíticas. O intuito foi selecionar as melhores cepas (220) para aplicação como culturas lácteas. O estudo foi publicado na revista científica Journal of Dairy Science.
Os protocolos utilizados nestas determinações foram desenhados para avaliação de propriedades das bactérias como grau de acidificação, potencial para a produção de enzimas, ação antimicrobiana, condições de crescimento em meios adversos como nos que utilizam cloreto de sódio na produção dos queijos, e resistência aos sais biliares e baixo pH durante o trânsito gastrointestinal. A metodologia empregada possibilita a análise do grande número de cepas testadas no estudo, reduzindo custos no tempo de análise, ao mesmo tempo em que evita a perda de informações, pois todas as cepas são testadas, ao contrário da abordagem tradicional, na qual se escolhe algumas poucas cepas para testes.
Acesse o artigo científico completo (em inglês).
Acesse a notícia completa na página do Jornal da Unicamp.
Fonte: Carmo Gallo Netto. Imagem: Antoninho Perri, Antonio Scarpinetti – Unicamp.
Em suas publicações, o Canal Nutrição da Rede T4H tem o único objetivo de divulgação científica, tecnológica ou de informações comerciais para disseminar conhecimento. Nenhuma publicação do Canal Nutrição tem o objetivo de aconselhamento, diagnóstico, tratamento médico ou de substituição de qualquer profissional da área da saúde. Consulte sempre um profissional de saúde qualificado para a devida orientação, medicação ou tratamento, que seja compatível com suas necessidades específicas.
Notícias relacionadas
Os comentários constituem um espaço importante para a livre manifestação dos usuários, desde que cadastrados no Canal Nutrição e que respeitem os Termos e Condições de Uso. Portanto, cada comentário é de responsabilidade exclusiva do usuário que o assina, não representando a opinião do Canal Nutrição, que pode retirar, sem prévio aviso, comentários postados que não estejam de acordo com estas regras.
Por favor, faça Login para comentar