Notícia

Função imunológica predomina em fígado de recém-nascidos

Pesquisa da UFMG mostra que desmame precoce pode interromper maturação de células do órgão

Foca Lisboa, UFMG

Fonte

UFMG | Universidade Federal de Minas Gerais

Data

terça-feira, 11 setembro 2018 11:30

Áreas

Nutrição Clínica. Nutrição Coletividades. Saúde Pública

Até o momento do desmame, o fígado de recém-nascidos desempenha quase exclusivamente funções imunológicas. A alteração da dieta, com introdução precoce de outros alimentos, pode interromper o processo de amadurecimento das células do sistema imune hepático e ativar antecipadamente a expressão das vias metabólicas desse órgão, tornando o indivíduo mais susceptível, ao longo da vida, a doenças medicamentosas. A descoberta, descrita em artigo publicado revista científica Journal of Hepatology, e também foi abordado  na edição 2.031 do Boletim da UFMG, sendo matéria de capa.

Coordenada pelo Prof. Dr. Gustavo Batista de Menezes, diretor do Center for Gastrointestinal Biology, localizado no Departamento de Morfologia do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), a pesquisa também inova ao revelar diversos aspectos que diferenciam o fígado de bebês do de adultos. “Observamos que enzimas utilizadas para  diagnosticar doenças hepáticas em crianças e em adultos podem não ter a mesma validade para recém-nascidos, simplesmente porque o fígado deles não as produz na mesma quantidade. Além disso, descobrimos que ao menos 30 diferentes genes metabólicos envolvidos no processamento de nossos alimentos são expressos em menor quantidade por recém-nascidos”, diz o Dr. Menezes. Segundo o pesquisador, a literatura descreve bem esse órgão no embrião e no adulto, mas não havia trabalhos conclusivos sobre o fígado nos primeiros momentos após o nascimento.

O grupo liderado pelo Dr. Gustavo Menezes também está desenvolvendo, em parceria com a empresa norte-americana Research Diets, pesquisa para sintetizar fórmulas parecidas com leite em pó que possam ser testadas em camundongos. “A tentativa não é imitar o leite materno, mas mitigar os efeitos da falta dele na maturação imunológica e metabólica do animal”, diz o pesquisador. Um dos objetivos da equipe é entender como os produtos encontrados no mercado, que não têm a mesma composição do leite materno, interferem na vida da criança.

Duas faces
O artigo tem como primeiras autoras Brenda Nakagaki e Kassiana Mafra, alunas do Programa de Pós-graduação em Biologia Celular da UFMG. A equipe tem mostrado que o fígado funciona como se fosse dois órgãos: além da função metabólica, amplamente conhecida, exerce importante papel imunológico. “Elaboramos um método, com animais de laboratório, e acompanhamos o desenvolvimento hepático desde as primeiras horas de nascimento até a fase adulta”, explica o professor. Segundo ele, o fígado do recém-nascido é essencialmente imunológico – diversas funções metabólicas permanecem desligadas até que os animais sejam desmamados da mãe.

Os pesquisadores constataram que quase todos os tipos de células imunológicas estão em processo de maturação no fígado de um recém-nascido. “Acreditava-se que isso acontecia apenas no feto, mas observamos que ocorre também no camundongo recém-nascido e pelo menos até a metade da sua infância, enquanto outros órgãos, como medula óssea e baço, ainda não estão maduros. Ou seja, no nascimento, o fígado ainda participa do processo de maturação do sistema imune e vai se tornando um órgão metabólico ao longo da vida, sem perder a sua face imunológica”, descreve o Dr. Gustavo Menezes.

Para acompanhar essa mudança, a equipe padronizou modelo de desmame prematuro em camundongos. “Achávamos que o fígado tinha um programa de amadurecimento próprio, independente de fatores externos. Contudo, no animal desmamado precocemente, o perfil metabólico hepático mudou completamente”, constata. O experimento indicou que o programa de maturação depende da amamentação, cuja interrupção causa desregulação, com possíveis consequências até a vida adulta. “Pode ser que a chave de algumas doenças em adultos esteja na interrupção desse processo de maturação”, supõe o professor.

Com relação ao tempo necessário à amamentação de humanos, o Prof. Gustavo Menezes afirma que não há um padrão. “Existe um período já estabelecido, de seis meses, que é um tempo aceitável pela maioria dos profissionais. Nossos dados também nos sugerem considerar agora quanto tempo essa criança ficou no útero. Hoje sabemos que isso também deve ser estudado. O período adequado de aleitamento pode ser variável, levando em consideração inclusive o tempo de gestação”, enfatiza.

O pesquisador explica que o modelo em camundongos não traz elementos para esse cálculo, devido à dificuldade em estabelecer relação de idade com humanos, já que esses animais experimentais atingem a vida adulta quatro semanas após o nascimento. “É muito grande também a diferença em tempo gestacional, que é de quase sempre 21 dias em camundongos, enquanto nos humanos a flexibilidade gestacional é muito maior com a ajuda da ciência. E na nomenclatura, todos somos recém-nascidos  desde o primeiro dia após o parto”, compara.

O grupo liderado pelo Dr. Menezes também vai gerar modelo de partos prematuros em animais, com o intuito de entender o quanto o bebê prematuro precisa ser mais bem cuidado. “Queremos sistematizar o estudo da maturação imunológica e metabólica no início da vida, usando modelos reprodutíveis. Temos percebido que esse assunto envolve muita especulação, tudo parece muito óbvio à primeira vista, mas continuamos a ter problemas”, pondera o Prof. Gustavo Menezes.

Pesquisa em humanos
Ao estudar fígado, medula óssea e baço em modelos animais recém-nascidos, o Dr. Menezes e sua equipe constataram que o fígado é o maior órgão imune desses animais. Para observar se o quadro era o mesmo em humanos, o pesquisador estabeleceu parceria com o Hospital das Clínicas da UFMG e analisou biópsias de pacientes – recém-nascidos, crianças e adultos – que morreram de problemas não hepáticos. Ao fim, observou uma similaridade enorme entre amostras de humanos e camundongos. “Eram lâminas que estavam guardadas, ou seja, não fizemos um estudo invasivo em seres humanos”, anota o professor, ressaltando que a análise desses materiais validou a pesquisa em camundongos.

O Dr. Menezes afirma que a plataforma criada em seu laboratório especialmente para essa pesquisa oferece condições para que diferentes grupos estudem a maturação do fígado e de outros órgãos importantes. “O artigo comprova que a plataforma é válida para predizer futuros problemas hepáticos com base em mudanças pontuais na alimentação, que pode ser avaliada em termos de constituição, tempo e conteúdo microbiano”, enfatiza.

Ele destaca que agora há condição experimental de ajudar órgãos públicos a entender que cuidar bem de uma criança é mais inteligente não só no aspecto humano, mas também financeiro. “Um adulto saudável é economicamente mais produtivo e usa menos o serviço público de saúde”, comenta o Dr. Gustavo Menezes, ressaltando a importância de mudar o direcionamento de políticas públicas para estimular e dar condições ao aleitamento materno e à nutrição infantil adequada.

Em sua opinião, reside na pesquisa científica a esperança para as crianças que não podem ser amamentadas, especialmente no caso de prematuros, em que a mãe ainda não teve tempo de maturar a glândula mamária. “A única opção para tentar mimetizar ao máximo a amamentação está na pesquisa. As fórmulas existentes não substituem o leite materno”, garante. o Prof. Gustavo Menezes destaca ainda a importância do trabalho desenvolvido pelo seu grupo, que, segundo ele, trata-se de “ciência feita no Brasil e aplicável em diferentes áreas, como a sociologia, a imunologia e a enfermagem”.

Acesse a notícia completa na página da UFMG.

Acesse o artigo completo no Journal of Hepatology

Fonte: Ana Rita Araújo, UFMG. Imagem: Pixabay.

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