Notícia
Fibras alimentares podem prevenir e controlar infecções respiratórias em crianças
É o que mostra estudo desenvolvido em parceria entre a Unicamp e a PUC-RS e recém-publicado no periódico “Nature Communication”
Antoninho Perri, Jornal da Unicamp
Fonte
Jornal da Unicamp
Data
terça-feira, 27 agosto 2019 13:00
Áreas
Nutrição Clínica. Nutrição Coletividades. Nutrição Funcional. Nutrição Materno Infantil
Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), publicaram na revista científica Nature Communications, trabalho em que avaliam o efeito dos ácidos graxos de cadeia curta sobre o desenvolvimento de infecção viral pelos Vírus Sincicial Respiratório (RSV) em camundongos. Dados pré-clínicos demonstravam que a suplementação desses animais com dietas enriquecidas com fibra solúveis ou com acetato de sódio adicionado à água consumida os protegiam contra a infecção por RSV, reduzindo significativamente a perda de peso, a carga viral e o infiltrado celular nos pulmões durante a doença.
O trabalho desenvolvido por pesquisadores das duas universidades começou, em 2013, por meio da colaboração do grupo coordenado pelo professor Dr. Marco Aurélio Ramirez Vinolo – do Departamento de Genética, Evolução, Microbiologia e Imunologia, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp – com o grupo da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do RS, liderado pela professora Dra. Ana Paula Duarte de Souza, especializado em vírus, a que se juntaram os pesquisadores da Unicamp Dra. Maria Teresa Pedrosa Silva Clerici, da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), que colaborou com o desenvolvimento de dietas destinadas aos animais; Dr. José Luiz Proença-Módena, do IB, especialista em virologia; e a Dra.Hosana Gomes Rodrigues, da Faculdade de Ciências Aplicadas, sediada em Limeira (FAC), que além de especialista em inflamação, auxiliou na quantificação de ácidos graxos de cadeia curta.
Mencione-se ainda a participação de alunos de pós-graduação da Unicamp incluindo o doutorando José Luís Fachi e a mestranda Laís Passarielo Pral, ambos do IB da Unicamp, e da doutoranda Krist Helen Antunes da PUCRS, coorientada pelo Dr. Marco Aurélio.
O docente, coordenador do projeto, esclarece que o trabalho foi proposto porque à época existiam dados epidemiológicos de que a ingestão de alimentos com alto conteúdo de fibras poderia gerar proteção em crianças em relação à infecções respiratórias. Paralelamente foi publicado um trabalho mostrando, em modelos animais, que o consumo de fibras poderia protegê-los em relação ao desenvolvimento de asma, também uma doença inflamatória respiratória. A propósito, diz ele: “Chegamos à conclusão que valeria a pena verificar se a infecção pelo Vírus Sincicial Respiratório (RSV) poderia de alguma forma ser prevenida ou atenuada. A infecção por esse vírus é muito comum em crianças recém-nascidas e até os três anos, em que a doença se manifesta em torno de 70% e em parte delas evolui para um quadro grave da inflamação respiratória chamada de bronquiolite, que inclusive pode causar a morte”. Essa doença, caracterizada pela vasta inflamação e edema das vias áreas, causa aumento na produção de muco e necrose das células epiteliais pulmonares especificamente nos brônquios. Em 2017, registrou-se em São Paulo aumento nos casos graves de crianças infectadas pelo RSV encaminhadas à UTI, o que despertou a atenção da comunidade médica e científica para a necessidade do desenvolvimento de terapias para o tratamento e contenção dessa doença. Não existe tratamento para essa infecção a não ser a utilização de medicações para amenizar sintomas como febre, dor no corpo, dificuldades respiratórias, a exemplo do que se faz com a gripe.
O estudo
No estudo os pesquisadores basicamente se valeram de animais de laboratório para testar a hipótese de que as fibras poderiam ter efeito benéfico frente ao vírus. Camundongos foram submetidos a uma dieta previamente formulada e rica em fibras. Para efeito comparativo, outro grupo recebeu dieta com baixo teor de fibras. O objetivo inicial era verificar se a pesquisa se justificava e deveria continuar na direção da hipótese aventada.
Depois de três semanas em dieta, todos os animais foram infectados para que pudesse ser verificado como responderiam à infecção. Observou-se que aqueles que ingeriram dieta rica em fibra tinham menos vírus no pulmão depois de cinco dias. Mais que isso, esses animais não apresentaram um quadro de inflamação pulmonar, diferentemente dos que tinham ingerido baixo conteúdo de fibras, nos quais se manifestara uma grande inflamação nos pulmões. Esse primeiro resultado mostrou que o consumo de fibras protege o animal contra a infecção por RSV.
Diante disso, os pesquisadores se propuseram a desvendar o mecanismo que leva a fibra a promover a proteção em relação a esse tipo de infecção. Já se sabia que essas fibras levavam à formação de compostos gerados naturalmente pela microbiota intestinal, os chamados ácidos graxos de cadeia curta, comum a todos os seres humanos, mas cujas concentrações podem variar e dependem de vários fatores, entre eles tipo de alimentação e condições metabólicas dos diferentes organismos. Essa variação de concentração pode tornar o indivíduo mais ou menos suscetível a vários tipos de doenças, embora não se soubesse ainda como se dava a ação desses compostos sobre a infecção provocada pelo vírus em questão.
Foram então realizados experimentos para comprovar que a proteção decorria da ação dos compostos gerados naturalmente pela microbiota, os ácidos graxos de cadeia curta. Para tanto, eliminou-se a microbiota dos animais com a aplicação de antibióticos. Ocorreu efetivamente a cessação do efeito protetor, mas que retornava quando os animais recebiam por via oral os ácidos graxos de cadeia curta. Comprovava-se, assim, a hipótese aventada de que esses ácidos graxos produzidos pela microbiota do intestino são absorvidos pelo órgão e agem nas células pulmonares, reduzindo a quantidade de vírus.
Acesse o artigo científico completo (em inglês).
Acesse a notícia completa na página do Jornal da Unicamp.
Fonte: Carmo Gallo Netto, Jornal da Unicamp. Imagem: Antoninho Perri, Jornal da Unicamp.
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