Notícia
Designers da UFPR ajudam a desenvolver proposta de rótulos alimentícios
A proposta sugere a implementação de alertas nas embalagens na intenção de ajudar o consumidor a tomar decisões de compras baseadas no impacto do alimento na saúde.
Divulgação
Fonte
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Data
quarta-feira, 18 outubro 2017 14:57
Áreas
Saúde Pública
Pesquisadores do curso de Design da UFPR participaram do desenvolvimento de um projeto que pode transformar as regras para rotulagem de alimentos no Brasil ao focar no direito do consumidor à informação sobre os produtos. Já em fase de apresentação à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a proposta sugere a implementação de alertas nas embalagens na intenção de ajudar o consumidor a tomar decisões de compras baseadas no impacto do alimento na saúde.
A iniciativa é liderada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e tem como ponto central vencer as dificuldades enfrentadas por consumidores para entender os rótulos e conhecer os alimentos. A principal delas é saber as reais características nutricionais dos produtos, que hoje podem estar dispersas em meio a muitas cores, promessas, nomes irreconhecíveis de ingredientes e porções não tabeladas.
Outro pioneirismo da iniciativa é posicionar a ciência do design informacional no centro das decisões que podem compor a nova regulamentação. Assim, os pesquisadores atenderam aos objetivos do Idec ao mesmo tempo em que compararam a eficácia de experiências brasileiras e estrangeiras na área, sempre sob o ponto de vista do Design de Informação.
Na semana passada, o Idec apresentou à Anvisa um abaixo-assinado com cerca de 18 mil assinaturas de apoio à proposta, mas o instituto pretende reunir pelo menos 30 mil até a consulta pública que a agência vai realizar sobre o tema, ainda sem data marcada. A petição continua no ar.
Design informacional
“O diferencial da proposta é mesmo essa expertise particular, já que tem uma fundamentação teórica no Design da Informação, que considera a percepção visual e a literatura de atenção”, avalia a professora e pesquisadora da UFPR Carla Spinillo, que desenvolveu a proposta com o designer Carlos Urquizar Rojas, mestre em design informacional pela UFPR.
Com isso, a proposta teve como ponto de partida garantir na rotulagem obrigatória o respeito a princípios do Design Informacional como o de legibilidade (facilidade de distinguir letras), leiturabilidade (absorção rápida da mensagem) e articulação textual (escolha certa das palavras para a mensagem).
Isso porque a iniciativa verificou uma distância considerável entre as intenções da regulação atual da Anvisa e o que o consumidor vai encontrar. De acordo com os pesquisadores da UFPR, as normas desconsideram que consumidores têm níveis diferentes de escolaridade e compreensão sobre nutrição. “Sabemos que o perfil da população brasileira não é este”, diz Rojas.
Soma-se a isso o fato de que as escolhas gráficas das embalagens não costumam valorizar os textos normativos. “Fica difícil de visualizar e ler a tabela e lista de ingredientes com letras tão pequenas, sem destaque, sem diferença de peso ou tamanho para sugerir hierarquia, e até aplicados sobre fundos com cores que não dão devido contraste na embalagem”, diz o designer.
Alerta em triângulos pretos
Assim, a proposta do Idec em parceria com a UFPR buscou soluções para esses problemas. Uma novidade para ajudar o consumidor é o alerta frontal nos rótulos sobre características marcantes dos alimentos — como presença de muito sal, açúcar, adoçante e gordura — seria feito dentro de triângulos pretos. A escolha forma se deu devido a uma regra do design informacional: a de que triângulo funciona como símbolo universal de advertência.
O formato também evita a situação enfrentada por consumidores no Chile, país que adotou uma norma de alertas nas embalagens avaliada pelo grupo de trabalho brasileiro. O octógono escolhido de forma aleatória acabou assimilado pelo design das embalagens, não chamando mais tanto a atenção quanto deveria.
“A ideia foi tirada da placa [de trânsito] ‘pare’, mas acabou sendo um tiro no pé”, avalia a professora Carla. “São muitos elementos para pouca área, fora que [o octógono] tem uma aparência que lembra um favo de mel e remete a doçura. Além disso, quando muito reduzido, perde o peso e parece um círculo”.
Já o preto foi considerado melhor do que outras cores mais chamativas por vários motivos. Primeiro, as embalagens de alimentos brasileiras costumam abusar de cores quentes, portanto qualquer cor do tipo prejudicaria o efeito de alerta. Em segundo lugar, está o significado do preto — uma cor ligada historicamente a regulação e obrigatoriedade, como as tarjas pretas dos remédios confirmam.
Para impedir que o alerta seja absorvido pelo design da embalagem, a proposta considerou ainda que o triângulo seja sempre impresso sobre um retângulo branco (no caso de embalagens coloridas) ou com contorno preto nas embalagens brancas.
O Idec também pretende que os alimentos que contenham alertas sobre reflexos nocivos do consumo para a saúde se abstenham de anunciar características consideradas “positivas”, como “fonte de vitaminas”.
De acordo com a nutricionista do Idec, Ana Paula Bortoletto, a ideia é que as advertências sejam obrigatórias para os alimentos classificados como processados e ultraprocessados. Segundo o Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde, esses são alimentos que precisam ter consumo limitado, enquanto o consumo de alimentos in natura e minimamente industrializados devem ser estimulados.
Além dessa situação, a sugestão é que recebam advertências produtos que excedem pontos de corte estabelecidos sob recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para a quantidade de açúcar livre, gorduras saturadas, trans e total, sódio e adoçante. Essas recomendações da OMS visam a prevenção contra doenças crônicas e obesidade.
Novidades para regulação
Uma sugestão importante do projeto é a intenção de agregar à regulamentação da Anvisa regras relacionados ao design — tamanhos (mínimo e máximo no caso dos alertas), posicionamento e cores, por exemplo, especialmente para que a tabela nutricional se torne mais visível.
Outra ideia é convencionar a porção que é analisada na tabela nutricional para duas medidas: pacote inteiro e a cada 100 gramas. Hoje não existe qualquer parâmetro fixo, o que força consumidores a fazerem cálculos matemáticos diante da gôndola. Isso porque, em tabelas nutricionais de marcas diferentes, o mesmo tipo de biscoito pode ser avaliado a cada 30 gramas ou 35 gramas, por exemplo.
Ainda quanto à tabela nutricional, o projeto quer que fiquem claros ao consumidor, já de antemão, a quantidade de ingredientes. Esse é um dos critérios para medir o grau de processamento de um produto alimentício.
Em seguida, a enumeração dos ingredientes contaria com uma espécie de “tradução” para que o consumidor possa identificar melhor do que se tratam nomes não usuais, como o “palmitato de retinol” — mais conhecido como vitamina A. Caso o produto tenha ingredientes que renderam alerta, eles também seriam destacados na lista.
Na descrição de Rojas, o redesenho da tabela nutricional e da lista de ingredientes teve como objetivos a padronização e o uso de recursos gráficos para facilitar a leitura e a compreensão. “Por exemplo: aumento seguro de contraste, aplicando sempre letras em preto sobre fundo branco, aplicação de negrito e letras maiúsculas e minúsculas para imprimir hierarquia às informações”, conta.
Próximos passos
Segundo a Anvisa, o processo para alteração da legislação sobre rotulagem de alimentos está em fase de recebimento de propostas preliminares, na qual a do Idec está incluída.
Após essa etapa, a agência informa que as propostas serão discutidas com um Grupo de Trabalho específico para que depois seja criado um cronograma para discussão do tema com a sociedade.
Para a nutricionista do Idec, a expectativa é que o assunto seja alvo de consulta pública ainda neste ano. Assim, as propostas seriam discutidas no colegiado da agência e, a nova regulação, seria publicada no início de 2018.
Segundo Ana Paula, a proposta do Idec deve se contrapor à da indústria alimentícia, que também participa do processo. Enquanto o projeto do Idec aposta no sistema de advertências, o setor buscará emplacar um sistema de três cores, inspirado nos códigos de trânsito, a fim de destacar características negativas e positivas dos alimentos. Assim, se um alimento tivesse pouco açúcar, por exemplo, essa característica seria destacada em verde; já o excesso de gordura seria marcado em vermelho.
“Esse modelo tem limitações porque leva o consumidor ao engano”, acredita Ana Paula. ” Em produtos semelhantes, o consumidor não saberá distinguir o que é melhor. Por exemplo, o que é melhor: um produto com dois [alertas] verdes e um amarelo ou um produto com um verde, um amarelo e um vermelho?”, questiona. Na visão do Idec, o sistema também beneficia produtos alimentícios cujo consumo não é recomendado pela OMS, como os refrigerantes sem açúcar que contêm adoçantes.
Apoio
Nessa etapa, a intenção do Idec e dos pesquisadores da UFPR é conscientizar o público sobre a discussão e levar a ele o conhecimento sobre a proposta que foca nos consumidores. “Acredito que estamos enfrentando o maior desafio agora. Precisamos de força política e popular para que a Anvisa implante o modelo que é melhor para a população brasileira”, defende Rojas.
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