Notícia
Descoberta variação genética que dificulta emagrecimento em adolescentes obesos
Uma alteração em um gene que dificulta o processo de emagrecimento foi identificada em pesquisa feita na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
Walter Siegmund, Wikimedia Commons
A pesquisa, feita com 76 adolescentes obesos entre 15 e 19 anos, mostrou que um polimorfismo no gene receptor da leptina – sinalizador da saciedade – altera de uma só vez a regulação neuroendócrina e o balanço energético.
Durante um ano, adolescentes pesando entre 101 e 120 quilos participaram de um programa de emagrecimento que incluiu atividade física e acompanhamento clínico, psicológico e nutricional por uma equipe multidisciplinar formada por médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e fisioterapeutas. No entanto, enquanto metade dos adolescentes perdeu em média 10% do peso inicial, a outra perdeu 6%.
“Essa diferença nos intrigou. Não é que uma parte não obtivesse resultado – eles reduziram gordura visceral, corporal e tiveram melhoras nos exames bioquímicos –, mas não era possível que fosse apenas uma questão de maior ou menor empenho. Por isso, resolvemos estudar a parte genética”, disse Flávia Corgosinho, autora principal do estudo publicado na revista Neuropeptides.
O artigo é resultado do doutorado de Corgosinho, com bolsa da Capes, e do projeto de pesquisa de sua orientadora, a professora Ana Raimunda Dâmaso, da Unifesp, com apoio da FAPESP.
Com a investigação genética, os pesquisadores descobriram que os voluntários que respondiam de maneira inferior ao programa apresentavam uma determinada alteração no gene receptor da leptina (LEPR rs2767485).
O estudo analisou os efeitos de um polimorfismo dentro de um único gene entre os mais de 500 genes relacionados à obesidade. Corgosinho conta que a variação genética estudada é do tipo recessiva e que metade dos voluntários apresentava pelo menos um dos alelos com a alteração, uma mostra significativa dos adolescentes obesos da cidade de São Paulo.
“Como não tínhamos grupo controle no estudo, não podemos extrapolar esse dado para a população em geral”, disse Corgosinho à Agência FAPESP.
O estudo em adolescentes se mostra importante, sobretudo se for levado em conta que a dificuldade de emagrecimento aumenta com os anos de vida. “Na infância e na adolescência ocorre a aceleração do metabolismo devido à fase de crescimento. É uma ótima oportunidade de favorecer o emagrecimento e modificar hábitos não saudáveis. Fora isso, a chance de um adolescente obeso se tornar um adulto obeso é estimada em 80%”, disse Dâmaso.
Mais fome
O grupo de pesquisadores descobriu também que voluntários com a variação genética que dificultava o emagrecimento apresentavam níveis de neuropeptídeos da fome – neurotransmissores que regulam a saciedade – elevados, quando comparados ao outro grupo sem a variação genética.
“Moléculas sinalizadoras da fome, conhecidas como NPY, AgRP e o Hormônio Concentrador de Melanina (MCH), estavam mais elevadas naqueles que tinham alteração genética. Isso significa que teoricamente eles deveriam sentir mais fome”, disse Corgosinho.
O acompanhamento dos adolescentes mostrou que, com a terapia de emagrecimento, eles conseguiram reduzir o índice desses neuropeptídeos para valores similares àqueles que não tinham variação genética. Com os exames de sangue provou-se que existe uma tendência de regularização desses sinalizadores de fome, porém, um deles (AgRP) continuou a subir.
“Com isso, percebe-se que o grupo já começa a terapia com os sinalizadores da fome elevados. Há até uma melhora durante o programa, mas ainda existe dificuldade em regular esses neuropeptídios que ativam a fome. Não por acaso, o processo de emagrecimento deles fica mais complicado”, disse Corgosinho.
Nível excessivo de leptina
A leptina é um hormônio produzido e secretado principalmente pelo tecido adiposo que entre outras funções participa do controle neuroendócrino do balanço energético. Embora sua produção esteja diretamente relacionada à massa adiposa, é no hipotálamo (cérebro) que ela estimula neurônios e neuropeptídeos relacionados com a saciedade.
Estudo anteriores já haviam demonstrado que na obesidade em adolescentes, apesar de a leptina estar em altas concentrações (hiperleptinemia), ela tem efeito reduzido ou ineficaz, não há boa inibição da fome e concomitante aumento do gasto energético.
Corgosinho conta que existem alguns mecanismos propostos para que isso ocorra. “Um deles é que esse excesso de leptina poderia danificar o receptor. Outra hipótese é que o excesso de leptina superativaria o feedback negativo. O fato é que ainda não está bem estabelecido o que provoca essa resposta”, disse.
Embora teoricamente quanto mais leptina, mais saciedade e aumento na oxidação de gorduras, no obeso ocorre o contrário: ele produz leptina em demasia e esse excesso acaba gerando uma ineficiência no receptor. Isso pode levar a um quadro de resistência à ação desse hormônio (dificuldades de passar pela barreira hematoencefálica, impedindo sua ação).
“No estudo, percebemos que ambos os grupos de adolescentes obesos apresentavam hiperleptinemia, o que era esperado, porém apenas o grupo sem o polimorfismo conseguiu reduzir a leptina para valores normais depois do processo de emagrecimento”, disse Dâmaso à Agência FAPESP.
Com o emagrecimento, o esperado era reduzir a leptina para níveis normais e voltar a ter uma regulação do sistema neuroendócrino, mediado por esse hormônio, favorecendo tanto o aumento da saciedade quanto do gasto energético. “Com esse mecanismo ativo, a chance de voltar a engordar ou ter aquele efeito ioiô são menores. Há um controle maior sobre o apetite”, disse Dâmaso.
As pesquisadoras afirmam que o estudo também rendeu outros achados relacionados ao metabolismo lipídico e ao processo inflamatório – insulina, resistência insulínica e colesterol – que estão em vias de publicação.
Acesse a notícia completa na página da Agência FAPESP
Fonte: Agência FAPESP. Imagem: Walter Siegmund, Wikimedia Commons.
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