Notícia
Especialistas comentam polêmico declínio do consumo de feijão no Brasil
Sempre que ocorre alteração de preço do feijão ressuscita-se a discussão se o ingrediente tradicional do prato está ou não perdendo espaço na alimentação do brasileiro
Pixabay
Fonte
Embrapa | Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Data
quinta-feira, 28 março 2019 11:30
Áreas
Agricultura. Agronegócio. Nutrição Coletividades
Sempre que ocorre alteração de preço o feijão entra na pauta do dia. Ressuscita-se a discussão se o ingrediente tradicional do prato está ou não perdendo espaço na alimentação do brasileiro. Nesse contexto, vários motivos são apontados para tentar explicar o que está ocorrendo. Com o aumento do preço do grão carioca no início de 2019, não foi diferente.
Com tantas notícias e argumentações, destacam-se: a histórica redução da área plantada com a leguminosa; a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF/2009) do IBGE, que aponta queda do consumo domiciliar do produto (que hoje estaria em 7,5 quilos per capita ao ano); e, outras fontes, como a Embrapa, que indicam que o consumo está estável em 14 quilos per capita ao ano.
Diante disso, a opinião de um time de especialistas da Embrapa Arroz e Feijão foi ouvida. Acompanhe abaixo a entrevista com Dra. Priscila Bassinello, pesquisadora em Ciência de Alimentos; Dr. Alcido Wander, Chefe Geral da Unidade e pesquisador da área de Economia; e Dr. Carlos Magri, analista da Embrapa e coordenador de uma rede de pesquisa de campo para mapear regionalmente hábitos de consumo, percepção e conhecimento de valores nutricionais e funcionais do arroz e do feijão.
Quais virtudes e limites do levantamento realizado pelo IBGE por meio da POF? Como interpretá-lo?
Dr. Carlos Magri: Essa pesquisa acompanha o consumo no domicílio, portanto não leva em consideração refeições feitas fora de casa, em restaurantes de comida a quilo. Uma das justificativas para explicar a redução do consumo per capita do feijão no domicílio é a mudança de hábitos alimentares, as pessoas substituíram o jantar por lanches. Dessa forma, não é possível afirmar, por meio dessa pesquisa, o real consumo per capita de feijão no Brasil.
Mas hoje se come menos feijão que antigamente?
Dr. Carlos Magri: Em termos gerais, quantitativos, há indicativos de redução do consumo, devido à mudança de hábitos. Antigamente as pessoas faziam três refeições ao dia: café da manhã, almoço e jantar. Atualmente fazem pequenas refeições intermediárias, às vezes comendo coisas saudáveis como frutas, outras vezes alimentos menos saudáveis. Portanto, estão comendo de forma mais espaçada, o que reduz o apetite nas refeições principais. Por outro lado, existem mais opções e acessibilidade de alimentos por parte de toda as classes sociais nessas refeições. Para afirmar de maneira categórica e inequívoca o nível de consumo do feijão, é necessário que sejam realizadas pesquisas que abordem questões como: a diminuição do consumo está ocorrendo em todas faixas da população, onde está havendo efetiva redução do consumo? Será que, em virtude da mudança do modo de vida e diversificações de produtos, as pessoas necessitam comer a mesma quantidade de feijão que se comia em décadas passadas? Será que a quantidade que se está comendo nos dias atuais não é suficiente, considerando as necessidades básicas em termos alimentares? Todo mundo precisa comer a mesma quantidade de feijão?
De modo geral, o consumidor vem substituindo alimentos não processados por produtos já processados pela indústria? Por que isso vem acontecendo?
Dra. Priscila Bassinello: Existe substituição pelo menos parcial dada à facilidade de acesso a esses produtos em pontos de venda não só em grandes centros comerciais, mas também via internet. Essa substituição acontece pela praticidade, preço e até mesmo pela vida corrida do consumidor moderno, que não tem mais tempo de preparar o alimento em casa. Isso tem levado ainda ao aumento do número de consumidores em restaurantes de comida a quilo. Simultaneamente, uma mudança percebida é a valorização do benefício à saúde dos alimentos. O nosso consumidor começou a atentar para a necessidade da qualidade nutricional e funcional dos alimentos. Portanto, recentemente, tem havido uma pressão para que os produtos industrializados, tradicionalmente ricos em açúcares, sal e gorduras saturadas, se transformem em produtos saudáveis sem perder o caráter da conveniência e praticidade. Aqui é que tem havido uma grande oportunidade para o aproveitamento industrial de grãos e suas farinhas como ingredientes de novos produtos industrializados com apelo nutricional e funcional, por exemplo, “gluten free”, “low fat”, ricos em fibras e proteína vegetal, dentre outros.
O modo de preparo do feijão, o tempo de cozimento, o cozimento na panela de pressão, é fator que desanima o consumidor?
Dra. Priscila Bassinello: Antigamente um dos fatores críticos era o tempo de preparo, porque o grão, além de ter que ser escolhido (catado), precisava ficar de molho e ainda demorava para ser cozido. Com programas de melhoramento genético do feijão, essa propriedade foi aprimorada e o tempo de cozimento não é mais um fator crítico, pelo contrário, hoje as pessoas apontam que o grão está cozinhando muito rápido e até desmanchando na panela. Com a popularização do uso da panela de pressão, o cozimento ficou mais prático e existem outras facilidades como panelas de pressão para micro-ondas. Além disso, há a opção de feijão industrializado pré-cozido, bastando apenas esquentá-lo, ou mesmo encontrar o produto cozido fresquinho nos restaurantes a quilo. O brasileiro também tem o hábito de guardar o feijão cozido congelado para facilitar o preparo no dia a dia. Portanto, não considero esse um problema importante.
Dr. Carlos Magri: O tempo de cozimento é um tabu. Em pesquisas realizadas pela Embrapa com consumidores, foi perguntado se o tempo de preparo e o uso da panela de pressão desencorajava o consumo de feijão. Raramente isso foi apontado como um elemento que desestimulasse o preparo. Outro fato interessante nessa pesquisa foi que ficou evidenciado que o feijão continua sendo bastante desejado, inclusive destacam a importância de fornecer às crianças. Porém, percebeu-se que existem muitas dúvidas sobre o real valor nutricional e benefícios e, sobretudo, se devem consumir quando possuem doenças como diabetes, hipertensão, colesterol e triglicerídeos altos. Nesse aspecto, considerando que o padrão alimentar que a sociedade está adotando tem sido apontado como uma das causas das doenças citadas, seria interessante um esforço coletivo para esclarecer esses pontos, na tentativa de manter o tradicional prato brasileiro. Esse movimento até tem nome, “Arroz e Feijão: A comida do Brasil”. Faltam parceiros para colocá-lo em prática.
Pelo feijão ser um produto tão tradicional, o consumidor pode estar enjoando?
Dra. Priscila Bassinello: Acredito que não, porque é uma tradição da nossa dieta. Estamos há anos consumindo e faz parte de nossa cultura nutricional. A dupla arroz e feijão é a única que se conhece fazer parte, espontaneamente, da composição diária do cardápio do brasileiro. Justamente porque não enjoa, é saborosa e alimenta. Mas existe, sim, interesse em diversificar. Existe hoje acesso, a um custo razoável, a mais opções de alimentos e de formas de preparo diferentes que despertam o interesse. A questão é que em várias dessas oportunidades o feijão não está incluso. Então, uma das críticas que faço para reverter essa ideia é que a gente também ofereça diferentes pratos à base de feijão, explorando as cores e os formatos dos grãos e modos de preparo. Tanto a Embrapa quanto outros parceiros possuem livros de receitas com feijão, e também na internet, mostrando a versatilidade de aproveitamento em pratos salgados e doces, nutritivos e saborosos.
Acesse a notícia completa na página da Embrapa.
Fonte: Rodrigo Peixoto, Embrapa Arroz e Feijão . Imagem: Pixabay.
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